60º passeio Março 2006



A Mata do Vimeiro

O primeiro domingo da Primavera e o último de Março chegou na companhia de um Sol ainda tímido. Sessenta Caminheiros dos Pimpões, corajosos e madrugadores, (desta vez dormindo uma hora a menos devido à alteração para o horário de Verão), fizeram-se à estrada por terras do Vimeiro de Alcobaça, em parceria com a Casa da Cultura José Bento da Silva de S. Martinho do Porto.

Continuar a descobrir o Património Histórico/Cultural e Ambiental dos antigos Coutos Cistercienses e poder projectar-se no passado, usufruindo de contínuas e novas sensações, é sempre uma grande aventura! A freguesia do Vimeiro, outrora uma das granjas dos Monges de Alcobaça, formada por quinze lugares, tem a sua história associada ao desenvolvimento da Quinta ou “Granja do Vimeiro” e à sua Mata Nacional.
Nesta floresta mediterrânea com trinta e dois hectares, o caminheiro pode usufruir de um dos únicos viveiros/laboratórios a nível mundial, sobre Sobreiros. Este projecto foi desenvolvido pelo Eng. Vieira da Natividade, ao longo de várias décadas.
Também a Fonte Gouvinha, local aprazível para um excelente piquenique, partilha o espaço deste MUSEU NATURAL VIVO, onde a Junta de Freguesia do Vimeiro colocou a seguinte inscrição:” Após encher os garrafões/ Dê a vez a outro/ Este lugar é de todos nós/ Estima-o.” Entre as experiências mais cativantes com os sobreiros, árvores únicas na produção de cortiça que, ao longo dos tempos, grande contributo têm dado para a economia nacional, não podemos deixar de referir a particularidade do processo de enxertia em garfo, que é feito no sentido inverso das outras árvores (em toda esta área os sobreiros são virgens, independentemente da idade, pois é proibida a extracção de cortiça).

Recordando um pouco a história do Vimeiro, poderemos afirmar que, possivelmente, remontará à Pré-História como pode ser comprovado pelo “Castro- Sítio do Castelo”, bem perto desta localidade e situado em Santa Catarina, actualmente objecto de intervenção arqueológica. Também na Quinta do Vimeiro, foram encontradas algumas lápides com inscrições e fragmentos cerâmicos antigos, além de uma faca e um pequeno machado, da Idade da Pedra, num quintal no centro da povoação.
Contudo, o seu passado ainda é mal conhecido! O seu padroeiro é S. Sebastião, que se festeja no dia 20 de Janeiro. Sobre este patrono, advogado contra as pestes, um dos mártires mais conhecidos da Antiguidade, (Roma século III / IV) , representado geralmente “atado à árvore nu e cravado com setas”, há uma lenda interessante que não podemos deixar de citar: “Há muitos, muitos anos… houve em Portugal um ano terrível de fome e peste.
Foram tantos os mortos que os mais crentes apelaram a São Sebastião para que os protegesse de tal flagelo. Se a doença se afastasse, se os doentes melhorassem e os animais escapassem, prometiam realizar anualmente a 20 de Janeiro, uma festa onde não faltasse pão e carne para quantos a ela comparecessem.” A primeira igreja matriz foi a capela do Espírito Santo ( século XVI ?) destruída no século XIX, na década de 50, para que fosse edificado o cemitério. O painel do seu retábulo, que se encontra actualmente na igreja paroquial, é apenas o testemunho que resta dessa capela.
Além de todas as figuras eminentes associadas à história local e desenvolvimento desta freguesia não podemos deixar de referir o Padre João Rebelo da Silva, (século XVIII), autor do famoso “Palito Métrico” (obra bastante interessante da literatura portuguesa, de carácter lúdico e escrita em latim macarrónico). O étimo “Vimeiro” está associado, possivelmente, ao arbusto ou pequena árvore com os ramos compridos e flexíveis que produz os vimes que, outrora, ocupavam os terrenos alagadiços e as margens dos ribeiros, como acontecia nas férteis várzeas da Quinta do Vimeiro.
Os trabalhos resultantes desta actividade artesanal, varas de tamanhos e diâmetros variáveis, acompanharam a evolução da História Portuguesa, satisfaziam as necessidades laborais tanto dos artesãos como dos agricultores. Cortado, descascado, posto a secar, o vime seguia então para a fase de transformação, em que os artesãos punham toda a sua criatividade e talento na criação de cestos de vários formatos, malas, caixas, cadeiras, mesas, berços. Produções estas que, pelo menos na nossa região, se encontram em total decadência e mesmo extinção .

A Quinta do Vimeiro, outrora com uma extensão de cerca de 800 hectares (hoje desmembrada em outras quintas e terrenos particulares de menor extensão), equivalente às antigas “Villae Romanae”, (conjuntos habitacionais com todas as infra-estruturas necessárias ao serviços agrícolas, inclusive complexos sistemas de banhos), foi uma excelente Escola Agrícola Monástica que aparece já referenciada em documentos antigos dos finais do século XIII (1296). A Quinta do Vimeiro, actualmente num lamentável estado de degradação, ainda possui uma linda capela integrada na casa senhorial, habitações diversas para os empregados, prisão, lagares de vinho e azeite, adegas, celeiro, cavalariças, “bugaria” entre outras.

(Como é possível, num País integrado há vinte anos num sistema capitalista da UNIÃO EUROPEIA, que um património tão rico, testemunho da História de um Povo e classificado de Interesse Público, esteja assim ao abandono? As PEDRAS olham para nós e suplicam-nos uma intervenção urgente! )

Algumas datas, (1636 e 1852), que remetem para o seu passado histórico, ainda podem ser constatadas nas cantarias e são testemunhadas pelo nosso guia, Sr. João Paulo e actuais proprietários, a família Pedrosa.

No século XIX, um dos seus proprietários, o Comendador Pedro José de Oliveira, um dos ilustres beneméritos do Vimeiro, também merece destaque muito especial pela quantidade de obras sociais realizadas. Entre as actividades económicas predominantes na freguesia, destacam-se a fruticultura e a pecuária.
A cerâmica, a indústria de madeiras e a metalomecânica são também pólos de desenvolvimento.

Pelo fim da manhã, o nosso 60º passeio pedestre, com grau de dificuldade fácil e circular como os anteriores, concretizara-se em duas horas e trinta minutos, numa extensão de cerca de nove quilómetros.



Texto – Manuel Correia
Fotos – Ana Sousa Santos e Jorge Melo


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