52º Passeio Junho 2005



“POR TERRAS DE D. GASTÃO”

Os Caminheiros dos Pimpões, no último domingo do mês de Junho, escolheram o Carvalhal Benfeito, para usufruir os segredos, lendas e encantos deste lugar e concretizar o seu 52º passeio pedestre.

Carvalhal Benfeito, situada na parte Leste do Concelho das Caldas da Rainha, é uma freguesia essencialmente agrícola, implantada numa área geográfica bastante acidentada e de indiscutível beleza, que atinge a sua expressão máxima no lugar de Cabeça Alta, de modo a libertar sensações tantas vezes mergulhadas nas profundidades da nossa alma e no esquecimento a que a vida nos conduz.

Os primeiros documentos escritos que citam esta povoação datam dos inícios do século XV. Carvalhal Benfeito é incluído na carta afonsina de couto e doação ao Mosteiro de Alcobaça, como uma das principais granjas (também designadas quintas). Nessa altura e até ao Século XIX, esta freguesia estava compreendida nos coutos e concelhos de Salir de Matos e de Santa Catarina.

No século XV, Carvalhal Benfeito aparece citado como um local de preferência na produção cerealífera e como um dos grandes celeiros, tal como as localidades cistercienses de Granja Nova, Ferraria, Vimeiro e Almofala.

A 22 de Setembro de 1537, o rei D. João III concedia armas a Diogo Fernando de Carvalhal Benfeito (provavelmente a personagem que terá dado o nome ao lugar), Adail e Cavaleiro da Ordem de Cristo (oficial que desempenhava as funções de sargento de infantaria) que passou a ser titular de grande parte destas terras, por serviços prestados em Arzila e Goa. As suas armas, constituídas por um baluarte de prata com frestas, portas e lavrado de negro, possuíam o timbre formado por um mouro vestido de malha e caído para a frente, de barba ruiva e uma lança quebrada que lhe passava debaixo do braço esquerdo e com um ferro ensanguentado. Ainda hoje se podem encontrar no local vestígios de uma grande residência senhorial, com portal deslumbrante, casa imponente de habitação, armazéns e muros bastante altos, em estado avançado de degradação, além de lindíssimos jardins (subterrados em terrenos cobertos de árvores de fruta), devido à existência de vestígios arqueológicos constituídos essencialmente por valas de drenagem, murais de jardim e cerâmicas diversas. (Apelamos para este património, natural e construído, cuja preservação e recuperação são necessárias e que pressupõem algum esforço, individual e colectivo).
Em torno desta povoação têm decorrido algumas histórias e lendas cheias de encanto e mistério que se têm perdido ao longo dos tempos. Destas não queremos deixar de referir algumas do testemunho do Sr. Henrique Duarte, de 82 anos de idade (Sacristão da Paróquia há 72 anos) e partilhadas por outros anfitriões da mesma terra. Conta ele sobre o Sr. Antonico, herdeiro da grande quinta de D. Gastão, que o rapto da filha, pelo herdeiro da Quinta da Mota, em Alfeizerão, (famílias que ao longo dos tempos tinham mantido grandes rivalidades, levou ao suicídio do pai da jovem; acrescenta ainda que, ao andarem uns bois a lavrarem os campos nos terrenos da antiga quinta, o chão se terá abatido sob o peso dos animais, deixando a descoberto um antigo forno de cal; fala também da existência um misterioso túnel, nunca encontrado, que teria ligado o vale à igreja, por onde, segundo a lenda, um mouro convertido à religião católica, secretamente se deslocaria à Igreja. O nobre D. Gastão, provavelmente condenado ao desterro no período da Restauração, em 1640, está também associado ao topónimo da terra, pois, segundo a lenda, quando se perguntava “Para onde foi D. Gastão?” A resposta era, “Para o Carvalhal (...). Então respondia-se, ”Ah foi? Então bem feito!(...)”. Segundo averiguações actuais feitas aos herdeiros e outros residentes, ainda hoje várias propriedades da Quinta do Carvalhal estão registadas na Conservatória, como terras do D. Gastão, (é urgente desmistificar e esclarecer rapidamente esta personagem da História, de cuja biografia nada conseguimos obter). A sua paróquia, cujo orago é Nossa Senhora das Mercês, foi constituída em finais da Idade Média. A igreja matriz, modernizada há alguns anos, é hoje substancialmente diferente da construção de origem, perdendo grande parte do seu valor histórico e arquitectónico. Anteriormente aos restauros efectuados na década de 70 (1970), tinha uma só nave, coberta de tecto de madeira de três planos, um altar-mor e dois colaterais, todos em talha dourada. Havia também várias pedras tumulares, quer no altar–mor, quer no corredor da nave central, algumas das quais de distintos residentes, com brasão de família. Algumas destas lápides tumulares encontram-se expostas no átrio da igreja matriz num estado avançado de degradação. Ainda relacionado com a toponímia local, poderíamos associar o seu nome à existência de um mosaico de carvalhos e sobreiros, de que resta actualmente a Mata das Mestras, intercalada com a flora mediterrânica rasteira, de matos e flores silvestres, recortada por um sem número de linhas de água e ribeiros. Estas matas foram desbravadas por séculos de arroteias, ou minadas por clareiras abertas com machados e charruas. Algumas tinham mesmo consentido dentro de si o crescimento de povoados. Entre as suas principais actividades económicas destacam-se a existência de pecuárias, moagem de rações, fábrica de cerâmica decorativa, panificação, entre outras. No Século XX, não podemos deixar de realçar a Quinta das Laranjeiras (cujo solar se encontra em estado de abandono), dos herdeiros do Sr. Luís Bonifácio, com capela privada, que desempenhou um papel importante no desenvolvimento agrícola e económico na época. Pertencem a esta freguesia os lugares de Antas de Cima (com reminiscências ao Megalitismo, do período Neolítico), Barrocas, Cabeça Alta (a 181 metros de altitude), Casal dos Carvalhos, Casal das Ladeiras, Casal do Pinheiro, Cruzes, Eiras, Hortas, Mestras (com papel de destaque para a sua Mata, Património Natural do Estado Português, com uma área de 96 ha), Osseira (antigas habitações de ursos?), Quinta do Bravo ( que, segundo a lenda, pertenceu ao Padre Bravo); Santana, Vale das Cuvas e Vale da Vaca. Através de algumas destas aldeias e lugares, por carreiros e caminhos tradicionais, com oito quilómetros de um apreciável desnível, o grupo formado por oitenta e três caminheiros, (entre os quais trinta e três caminheiros Belgas do CLUBE EGMONT, em digressão pela Região Oeste), foi compensado por maravilhosas panorâmicas, num perfeito ambiente acolhedor e hospitaleiro. O Conde Egmont, que dá o nome a este Clube, é um herói e nacionalista Flamengo, que está associado à revolta contra o domínio espanhol, durante o reinado do Rei Filipe II. A Guerra dos 80 anos ou Revolta Holandesa de 1568 a 1648 - simultânea com a Restauração Portuguesa de 1640, foi a guerra de secessão na qual o território, englobando aquilo que é hoje os Países Baixos, se tornou um país independente).
É de não esquecer que os judeus ibéricos, perseguidos pela Inquisição Portuguesa no Século XVI, também conhecidos por Sefaraditas, tiveram um papel importante no desenvolvimento cultural e económico dos Países Baixos, desfrutaram ali da liberdade de culto e de expressão, invejáveis para a maioria dos judeus nas restantes partes do mundo.

Ao Presidente da Junta de Freguesia, Sr. Manuel Pedro, um dos promotores e dinamizadores deste passeio, ao Presidente da Direcção da Associação Desportiva e Recreativa, Eng. Ricardo Augusto e ao grupo que preparou as filhós e o almoço, deixamos expressos os nossos agradecimentos

Texto – Manuel Correia Fotos – Jorge Melo

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