Junho 2004
Nas margens de um rio, entre o "Casal da Areia e o Formigal"
Casal da Areia, Infantes e Formigal, pequenos lugares da freguesia de Salir de Matos do Concelho de Caldas da Rainha, foram os locais escolhidos pelos Pimpões, no último domingo de Junho, para a concretização do 41º passeio pedestre efectuado por esta Associação, percurso circular como os anteriores, dando assim oportunidade a que cerca de meia centena de pessoas pudessem manter-se em boa forma física, usufruindo de uma lindíssima paisagem e em excelente companhia, sob a protecção de um ameno sol de Verão. A caminhada com cerca de nove quilómetros, com uma duração média de três horas e grau de dificuldade médio, teve o seu início nos Casais da Areia, com uma pequena visita ao Património Histórico / Natural, bem descrito pelo Dr. Carlos Marques, que passamos a apresentar. A Capela de Nossa Senhora da Conceição, sem atributos arquitectónicos de relevo, tem a simplicidade harmoniosa e discreta do templo de aldeia. Erguida em devoção de Nossa Senhora das Necessidades, no seu interior e adro foi sepultura das gentes dos lugares que a rodeiam. Em testamento de 1834, Genoveva Maria da Piedade, proprietária de uma das Quintas do Casal da Areia, manifesta, as seguintes vontades: “Quero que o meu corpo seja amortalhado em hábito de S. Francisco, e será minha sepultura a Capella de Nossa Senhora das Necessidades, deste lugar, com assistência de oito padres (...) e dirão os mesmos padres vinte missas cada um por minha alma (...) dar-se-á a cada homem que pegar no meu caixão e conduzir-me à minha sepultura cento e vinte réis e a cada pessoa que me acompanhar à sepultura se darão vinte réis (...) deixo como legado à Capella de Nossa Senhora das Necessidades deste lugar a quantia de nove mil e seiscentos réis anualmente aplicada para ajuda do Capellão que disser a missa aos Domingos e dias Santos na mesma Capella (...)”. Mudaram-lhe posteriormente o nome, numa época em que se intensificou o culto da Imaculada Conceição, na sequência da bula do Papa Pio IX, de 1854, que decretou esse dogma. Junto ao largo do Casal da Areia, na adega que fez parte de uma antiga quinta, e que hoje pertence a José Gomes dos Santos, um velho lagar ostenta uma vara de pinheiro manso de cerca de três toneladas, um fuso e uma pedra com o mesmo peso, a recordar o tempo em que as uvas eram esmagadas com o peso da pedra e da madeira. No imenso vale, por entre várzeas férteis, vinhas e pomares, corre o rio Tornada ou de Salir, que durante séculos separou as terras dos coutos da Abadia de Alcobaça, das do termo de Óbidos. Quem o veja hoje, confinado às suas estreitas margens, não suspeitará que no século XV, ali junto ao Formigal, havia um porto fluvial, com partida e chegada de barcos que o navegavam, carregados de produtos agrícolas, até ao mar de Salir. Mas o passado deixou vestígios, nas encostas que foram as antigas margens, e por isso, caminhar ao longo deste rio é viajar até ao tempo dos barcos que o percorriam. Acerca do lugar dos Infantes, o Cadastro da Estremadura de 1527 chama-lhe Casal do Infante e não lhe atribui mais de dois vizinhos nessa data. Nos vales que o contornam há fontes de água fresca, que tornam as hortas viçosas e refrescam o caminhante. Sobre esta lindo lugar há uma pequena lenda, recolhida no ano lectivo 1998/99, por Diogo Sousa aluno do 6º ano da Escola E.B. D. João II de Caldas da Rainha, que diz o seguinte: “Há muitos, muitos anos, os Reis andavam numa caçada e o Infante acabou por se perder no meio do mato e foi encontrado por uns camponeses. Aí viveu durante uns dias, até que um dia o rei o veio buscar. Este ficou muito agradecido e por isso deu o nome de Infantes à aldeia onde eu vivo”. Uma pausa para o “café da avó”, no Casal da Eira Branca, da família Gameiro, permite um olhar pelo imenso vale a perder de vista. De súbito, a Ermida de Nossa Senhora da Piedade, na Quinta do Formigal, surge com uma nesga da pirâmide parcialmente despida de belíssimos azulejos, única parte visível da capela na moldura densa e verde que lhe confere um ar de recolhimento e de irremediável abandono. Portas escancaradas, silvas, musgo e mato, vestígios silenciosos da destruição de um dos mais belos templos da região, que lamentaremos um dia, quando for demasiado tarde, e não restar pedra sobre pedra. Por enquanto, ainda o caminhante vai a tempo de se deslumbrar com a elegância da pirâmide, com as formas geométricas e as cores quentes do tecto, com o magnífico frontal do altar do início do século XVII, com o brasão das armas da família Garcez, ramagens floridas e aves de gosto exótico inspirado nos motivos hindus. Sobre a flora, vão surgindo ao longo do percurso, agriões macieiras, nespereiras, oliveiras, pereiras, pessegueiros, videiras, fetos, giestas, heras, juncos caniços, carrascos, carvalhos, choupos, eucaliptos, loureiros, pinheiros, salgueiros, silvas, sobreiros, ulmeiros, urzes. Na fauna destacam-se a andorinha, o bico-de-lacre, a carriça, o cartaxo, o chapim, a codorniz, o coelho bravo, o cuco, a felosa, o gaio, o melro, o ouriço, o pardal, a perdiz (santuário), o pica-pau, o picanso, o pintassilgo, a rã, a rola, o sapo, entre outros. Toda a região é “santuário” da perdiz, que às vezes se vê em pequenos grupos, a saltitar livremente no espaço protegido. À medida que alguns terrenos vão ficando incultos, ressurgem, aqui e além, pequenas espécies selvagens, como javalis, texugos e raposas.
Contribuíram para o sucesso deste passeio pedestre o Ex.mo Sr. Dr. Juiz Carlos Marques Querido, a esposa, Dr.ª Maria do Céu e o Professor José Melo. Um agradecimento muito especial à família Gameiro, proprietária do Casal da Eira Branca, onde nos foi servido um delicioso pequeno almoço que bem nos retemperou as forças para se poder concluir a outra metade do percurso. Se pretender saber mais sobre o próximo passeio a realizar a S. Martinho e dinamizado pela Casa da Cultura José Bento da Silva, apareça em frente aos Pimpões à hora habitual no último domingo de Julho.
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