Fevereiro 2004

Pelos “altos e baixos” de Trabalhias

Trabalhias, pequeno lugar da freguesia de Salir de Matos do Concelho de Caldas da Rainha,(existe neste Concelho outra localidade com o nome de Trabalhia na freguesia de Alvorninha) foi o local escolhido pelos Pimpões, no último domingo de Fevereiro, para realizar o seu 37º passeio pedestre, perante a ameaça dos habituais aguaceiros que nos têm acompanhado nestas últimas manhãs de Inverno. O percurso circular, com partida e chegada à povoação das Trabalhias, começou com uma visita à Associação Cultural e Desportiva, fundada em 1979, espaço associado a diversas actividades desportivas e culturais tais como o Rancho Folclórico "ALEGRIA DA NOSSA TERRA", o Grupo de Dança "100% JOVEM" e EQUIPA DE FUTSAL. O grupo formado por cerca de cinquenta pessoas prosseguiu pela estrada de acesso à antiga Quinta da Vimeira, a estrada dos Infantes, zona das Ozónias, a Rua dos Luíses, Casal dos Guilhermes, lugar da Matinha, Casal do Adário e Zona das Estevas. Caminhou-se assim por montes e vales cruzados por carreiros e trilhos enlameados, até se chegar ao termo do percurso, a capela de S. Sebastião (1928), recentemente sujeita a obras de restauro, orago, que segundo o testemunho de alguns moradores desta localidade, os tem protegido da “ fome, peste e guerra”.A sua história e a das suas gentes perde-se no tempo, havendo todo um trabalho de levantamento que os investigadores poderão desenvolver, história esta associada à antiga vila de Santo António de Salir de Matos, (no foral de D. Manuel I, de 1514, a freguesia é denominada de Salir do Matto) território abrangido pelos antigos Coutos de Alcobaça e outrora também sede de Concelho, extinto em 1836 com as reformas da Revolução Liberal. Vestígios arqueológicos nela encontrados comprovam o povoamento romano da região.Salir de Matos, a sede de freguesia, foi uma das treze Vilas dos Coutos do Mosteiro de Alcobaça. Um topónimo que terá a ver com a realidade geográfica do território na época da Reconquista Cristã, provavelmente inculta e não trabalhada. Segundo relato da obra “Memória sobre os Coutos”, a aldeia das Trabalhias em 1527 tinha quatro vizinhos e “ a vila de Salir do Mato” tinha cinco vizinhos no corpo da vila. Numa conversa amena e agradável mantida com um dos mais antigos habitantes da aldeia, Sr. Joaquim Bernardo (com 83 anos), foi-nos referido que Trabalhias ter-se-à desenvolvido com a vinda de trabalhadores para a Quinta da Vimeira (possivelmente do séc. XVIII), totalmente em ruínas, para se dedicarem às várias actividades económicas relacionadas com a exploração dos vimes. Ainda hoje a sua economia se baseia na agricultura e na pecuária.Contou-nos o Sr. Joaquim Bernardo, através de relato da Professora Ana Cândido, uma pequena história que nos reporta ao passado, relacionada com algumas razões que levaram à edificação da Capela de S. Sebastião. Como era costume, por ocasião das festas em honra de Nª Sª da Ascenção, os estandartes das Trabalhias eram levados para Salir de Matos a fim de participarem na procissão. No final da procissão, como o dia se apresentava muito chuvoso foi decidido não levarem de volta os estandartes, para que não continuassem apanhar a chuva que teimava em não parar. Assim que o tempo melhorasse, alguns habitantes iriam a Salir de Matos, para os trazer de volta a casa do juiz da festa, a cuja guarda ficavam até à próxima utilização. Os habitantes de Salir de Matos entenderam que a guarda dos estandartes por uns dias lhes dava direito de posse efectiva. À discussão acesa seguiram-se as vias de facto refrega essa de tal forma violenta que alguns dos contendores tiveram de receber tratamento no antigo hospital Santo Isidoro de Caldas da Rainha. Perante tais factos, decidiram a partir daí construir uma capela no lugar das Trabalhias.Em Salir de Matos /Trabalhias, o roteiro gastronómico aconselha o cozido à portuguesa, o bacalhau com as batatas a murro, queixadas no forno com arroz saloio e, para a sobremesa, filhós e bolo de ferradura. Contribuíram para o sucesso deste passeio pedestre a Direcção da Associação Cultural e Desportiva, principalmente o Sr. Pedro Alves, a D. Nisa Tavares e a família Bernardo (destaque para o sr. Joaquim e António Bernardo) que ao disponibilizarem um excelente lanche com filhós e café da avó a meio do percurso, nos fizeram recordar algumas iguarias deliciosas de outrora, gesto este que mostrou a verdadeira a amabilidade com que a população recebeu o grupo de caminheiros dos Pimpões. Agradecemos também ao Ex.mo Sr. Dr. Juiz Carlos Marques Querido, filho da terra, toda a informação que nos prestou.

Texto – Manuel Correia

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